Desemprego de Estrangeiro no Brasil – I

Como todos os que acompanham o blog sabem, a tarefa de conseguir o primeiro emprego no Brasil para meu marido estrangeiro foi extremamente árdua por inúmeros motivos, mas felizmente conseguimos e não temos dúvida que a intensa jornada valeu cada segundo. Se você é novo por aqui, ou não lembra como foi isso, recapitulo para vocês: levamos quase dois anos para conseguir emprego para ele, enviamos mais de dois mil currículos, recebemos mais de 40 telefonemas e ele fez 24 entrevistas pessoalmente. Ao fim de todo o processo, ele conseguiu duas ofertas de emprego. A escolha foi embasada na estabilidade do setor em que ele trabalharia. Contei tudo em detalhes no post “Como Conseguir Emprego para Estrangeiro no Brasil – Relato de Sucesso“.

Pois bem, nossa felicidade durou até o dia em que soubemos que a planta em que ele trabalhava encerraria suas atividades, o que aconteceu apenas dois anos e meio depois que ele foi contratado. Não sabíamos disso, mas o fechamento da fábrica já estava previsto desde a época em que ele começou a trabalhar na empresa. Diante do fechamento iminente, havia duas possibilidades, ser realocado em outras plantas ou ser mandado embora. Ele foi mandado embora.

Foi um choque para mim quando soube. Lembrei de todo o sacrifício que foi para arranjar aquele emprego, todo o esforço que, de repente, não mais que de repente, virou em nada. E a crise econômica? E o desemprego galopante? E o tanto de gente sendo expelida diariamente do mercado de trabalho? E a falta de oportunidades? E o fato de ele ser estrangeiro? E agora?

Eu não queria começar tudo de novo, então chorei, fiquei angustiada, chorei de novo, e o aperto no peito não passava. Enfim, sobrevivemos e nos resignamos. Outros planos teriam de ser traçados e foi o que fizemos. Aos poucos comecei a me organizar para começar a procura por um emprego novo tudo novamente, enquanto ele começou a estudar para um teste internacional com o objetivo de tentar uma bolsa de MBA no exterior. Essa parte não me agradou muito, porque não tinha e continuo não tendo vontade nenhuma de viver no exterior novamente, mas não o impedi nem o atrapalhei em seus objetivos.

Em relação à parte burocrática da demissão, não só para ele, mas também para mim, foi tudo novidade, pois nunca fui demitida na vida. É chato correr atrás da papelada, mas não tem segredo e nem dificuldade, o processo todo é muito intuitivo e igual tanto para brasileiros quanto para estrangeiros, nada diferente, nada especial. Eles têm garantidos todos os direitos trabalhistas como se brasileiros fossem. Sacamos o FGTS e mais ou menos 2 meses depois demos entrada no seguro desemprego, cuja cota máxima ele recebeu por 5 meses.

No começo, ele estava até que animado com o desemprego, ou talvez fosse só fachada, não sei. Ele planejou estudar, malhar, levar uma vida mais saudável e menos estressada enquanto definiríamos os novos planos. O trabalho que ele desempenhava era muito estressante, de muita pressão, então a demissão, no fim das contas, não foi de todo ruim. Mas como era de se esperar, passada a empolgação inicial e caindo na rotina novamente, agora em casa, logo tudo ficou meio nebuloso, especialmente diante das péssimas notícias em relação ao futuro do Brasil. Ele ficou ainda mais estressado, irritado, passou a pegar mais em meu pé, a ser menos compreensivo e também passou a desejar retornar ao seu país de origem. Definitivamente não foi um período legal. Acredito que todos aqueles que já passaram por isso, estrangeiros ou não, sabem bem do que estou falando. A falta de perspectiva, aliada a um futuro incerto, não é uma boa combinação.

Com o desemprego oficializado, dei início aos trabalhos de procura por um novo emprego já no dia seguinte, mas com o coração na mão, porque eu realmente não estava confiante de que um estrangeiro desempregado no Brasil teria vez em um mercado de trabalho em grave recessão. Era uma situação que eu não havia experienciado ainda.

Logo no primeiro mês, enviei mais de 100 currículos, 101 para ser exata, em sites de consultoria, emprego e também por e-mail. Recebemos uma mísera ligação ao final daquele mesmo mês, mas quando a pessoa do outro lado da linha percebeu que se tratava de um estrangeiro, deu um jeito de logo finalizar a ligação. Disse que ligaria novamente mais tarde porque teria uma reunião dali a poucos minutos. Uma desculpa, claro, a ligação simplesmente nunca aconteceu. Nem me surpreendi, porque já tinha visto esse filme antes. Alguns dias depois, mais uma ligação para uma entrevista na empresa que meu respectivo viria a trabalhar mais tarde, mas que naquela ocasião não deu em nada. Em suma, em mais ou menos três meses, eu havia mandado quase 300 currículos que resultaram em apenas duas ligações, uma média que achei péssima, mas até entendi, pois fim de ano é mesmo uma época tradicionalmente ruim para conseguir um emprego, todo mundo com a cabeça nas festas.

Comecei o ano seguinte (2016) com todo o gás, pois gosto de início de ano, sinto-me renovada e mais disposta. Até aquele momento, eu só pagava o plano trimestral básico da Catho. Decidi, então, investir no plano trimestral do BNE (Banco Nacional do Emprego) também. Em janeiro, mandei 123 currículos, e em fevereiro, 103. Em março, as coisas começaram a ficar estranhas, percebi uma diminuição significativa nas vagas de trabalho na área do marido, o que se refletiu na quantidade de currículos que enviei. Naquele mês, foram apenas 75 currículos enviados, o que realmente me deixou preocupada. Abril, então, foi pior ainda, em dez dias, enviei apenas 7 currículos! Não foi preguiça, nem diminuição do esforço na procura, pois tudo continuava igual, o problema foi mesmo a falta de vagas! Já era reflexo da grave crise que assolava o país. Entretanto, entre janeiro e março, ele fez 5 entrevistas, e em duas foi selecionado entre os finalistas. Isso me aliviou um pouco, pois percebi que mesmo sendo estrangeiro, ele era considerado no mercado de trabalho, portanto as questões discriminação e xenofobia puderam ser afastadas.

Eis, então, que das duas entrevistas em que ele ficou entre os finalistas, uma foi convertida e conseguimos um novo emprego!!! E um detalhe muito importante, isso aconteceu com apenas 6 meses e meio de desemprego, uma conquista e tanto! Por quê? Porque as pessoas com a mesma qualificação de meu marido, brasileiros, estavam demorando muito mais tempo para conseguir um novo emprego. Conheci, inclusive, uma pessoa que estava há mais de um ano desempregada e que precisou se virar como atendente de loja, mesmo tendo um diploma de engenharia. Ver o tempo de procura por um emprego cair de quase dois anos, como foi na primeira vez, para apenas seis meses e meio é algo realmente incrível, nem eu acreditei. E não foi sorte, definitivamente.

Vamos, então, aos números:

  • 568 currículos enviados;
  • 7 ligações para entrevista, sendo uma entrevista apenas por telefone, as demais todas pessoalmente;
  • Média de 1 ligação a cada 81 currículos enviados.

O processo seletivo para a vaga para qual ele foi selecionado consistiu das seguintes etapas:

  • Primeiro contato por telefone convidando para a entrevista (que na verdade foi uma dinâmica);
  • Dinâmica em grupo com 8 pessoas;
  • Convocação para a segunda etapa do processo seletivo por e-mail;
  • Entrevista individual e apresentação de 20 minutos de cada um dos 4 selecionados da primeira etapa com o gerente;
  • Escolha do candidato.

O resultado veio muito rápido. A etapa da entrevista individual foi em uma segunda-feira à tarde e no dia seguinte, bem cedinho, ele já estava recebendo a ligação com a notícia da aprovação e a convocação para reunir os documentos e começar a trabalhar em dois dias. Nem tivemos muito tempo para celebrar ou digerir a conquista, foi bem estranho, mas me causou um alívio imediato, uma vez que não precisaria mais enviar currículos diariamente. Aquilo estava realmente consumindo muito do meu tempo, como deve mesmo ser, pois procurar um emprego deve ser encarado como um emprego. O problema era que isso consumia um tempo que eu não tinha e estava muito difícil equilibrar todas as minhas atividades e responsabilidades, eu estava extremamente estressada.

Preciso destacar que as sete vezes em que o currículo do respectivo foi selecionado foi pelos seguintes meios:

  • Vagas.com – 2 vezes
  • Catho – 2 vezes
  • E-mail direto para vagas específicas – 2 vezes
  • Meio desconhecido (realmente não sei como chegaram ao currículo dele) – 1 vez

Por ter investido nos planos pagos da Catho e do BNE, esperava mais deles, então achei que esses serviços deixaram a desejar naquela ocasião, eu realmente esperava mais ligações, especialmente do BNE. Se eu pagaria novamente? Muito provavelmente a Catho, pensaria melhor no caso do BNE. Mas estou muitíssimo satisfeita com o Vagas.com, além de reunir as melhores empresas e vagas, é um site gratuito e foi o meio pelo qual enviei o currículo do respectivo para a vaga que resultou em sua contratação.

Por que compartilho tudo isso aqui com vocês? Porque sempre escuto a mesma ladainha de que é quase impossível para um estrangeiro conseguir um emprego no Brasil, e que quando consegue foi por sorte ou por indicação. Isso é MENTIRA e desculpa de gente que não se empenha de verdade. Meu marido não é sortudo nem conseguimos indicação nenhuma de quem quer que seja, tudo é fruto de nosso esforço conjunto, da nossa garra, da nossa dedicação: sou responsável pela redação do currículo, da carta de apresentação e do corpo dos e-mails, bem como pela procura das vagas e envio dos currículos, e meu marido, claro, fica responsável por toda a preparação antes das entrevistas, que incluem pesquisa sobre a empresa, preparação das respostas mais perguntadas de modo a relacionar a sua experiência com os requisitos da vaga, pela preparação para os testes, e assim por diante. Em suma, funcionamos muito bem juntos, e continuaremos assim até o fim.

Nós, brasileiros, somos a grande chave do sucesso de nossos companheiros no Brasil, por isso precisamos participar ativamente, auxiliando-os naquilo que for possível. Se este post foi útil e esclarecedor, deixe seu comentário, curta e compartilhe! Obrigada!

manualquasepratico@hotmail.com

Homesickness

Para quem ainda não sabe, homesickness é uma palavra inglesa que significa, basicamente, saudade de casa. Logo, você deve ter compreendido que essa palavra, um dia ou outro, fará parte da sua vida inevitavelmente caso você tenha um parceiro estrangeiro. Eu já passei e ainda passo maus bocados por causa dos efeitos da dita cuja (in)diretamente em minha vida e digo que não é fácil.

Quando eu morei no país de meu marido, eu não sofri nem um pouco de saudade de casa, talvez porque eu não tenha morado por anos no exterior. Apenas sei que em nenhum momento eu sofria por não estar em minha casa com minha família no Brasil, comendo as nossas comidas, nem nada. Às vezes eu sentia um desejo passageiro de comer algum doce especial que sempre costumava comer, mas o desejo por um docinho em nada se assemelha àquilo que homesickness realmente é. Eu gostei do lugar, das pessoas, da comida, da cultura, nada me fazia lembrar com nostalgia nem dor no coração ao pensar em meu lar e minha família no Brasil. Talvez o grande motivo tenha sido por não ter morado tanto tempo fora, ou então por não ter um relacionamento bem próximo com meus familiares. Sei, no entanto, de casos em que a pessoa, em apenas um mísero mês, já estava tendo ataques sérios de homesickness, o que mostra que isso é algo muito subjetivo, tem gente que sofre mais, tem gente que sofre menos e tem gente que nem chega a sofrer por causa disso.

Meu marido é um homesick diferenciado, em alguns aspectos ele é completamente homesick, em outros não é nada. Em seu primeiro mês no Brasil, tudo era alegria, gostou de tudo, de todos e não estava sentindo falta de absolutamente nada. Comeu quase tudo o que lhe foi oferecido e se esforçou para se ambientar. Mas isso não perdurou.

Primeiro sintoma que apareceu foi o fato de ficar na internet diariamente, por longos períodos, navegando em sites do país de origem dele, seja noticiário, entretenimento ou assistindo a filmes, absolutamente tudo de lá. É claro que queremos saber o que anda acontecendo em nosso próprio país, mas limitar-se somente a isso não é legal, em especial em um momento em que você deve se esforçar ao máximo para se integrar ao novo ambiente e se familiarizar mais e mais com o idioma. Sempre sugeri a ele que assistisse a alguns filmes brasileiros e que vez ou outra lesse algumas notícias sobre nosso país, mas não adiantou muito, ao menos naquele momento ele estava mais interessado pelas coisas de lá. Até quando assistimos a alguma coisa no computador juntos, nunca é nada daqui. Com relação a música, ele é mais espertinho. Aquelas mais populares, de maior sucesso, que tocam muito por aí acabam, naturalmente, chamando sua atenção, mas é só, no fim das contas, sou eu quem sabe muito mais das coisas de lá do que ele as daqui, mesmo ele morando no Brasil há um tempo considerável.

Mas, sem sombra de dúvida, a coisa que mais atrapalha a minha vida é a questão da comida. Meu marido vem de um país asiático e só de ler a palavra “asiático”, já dá para imaginar que se trata de hábitos alimentares muito diferentes dos nossos hábitos ocidentais. A comida que meu marido sempre foi habituado a comer sempre foi muito condimentada, o que muda completamente o gosto de um simples refogado de verdura. É lógico que ele não gostou do modo como temperamos a comida aqui, uma cebola picadinha, um dente de alho e uma pitada de pimenta e sal é tudo o que ele não quer comer, além de não comer carne bovina e suína, para piorar ainda mais o quadro.

Outra coisa foi o fato de querer falar com a família e amigos o tempo todo. Agora ele é mais comedido, mas por muito tempo a coisa era um exagero. Tudo bem sentir saudade da família, é normal, ele dizia que não sentia muita saudade deles, mas tinha a mania ou simplesmente o hábito de falar com eles diariamente por horas, não sei como tinha tanto assunto assim para conversar, eu sempre achei muito estranho aquele comportamento dele. E era sempre ele quem ligava para os familiares para que eles ficassem online para conversar, dificilmente o contrário. Quando esse exagero começou a afetar nosso relacionamento, tive de começar a reclamar, não houve jeito. Ele não gostou, é claro, alegou que não tinha muito o que fazer, o que me deixou mais irritada ainda, como assim não tinha muito o que fazer? Eu sempre procurei deixar bem claro que, se ele estava sentindo tanta necessidade assim de falar exaustivamente com os familiares, por que fez questão de vir morar no Brasil então? Aos poucos ele foi percebendo certas coisas e diminuindo aquele ritmo frenético, mas vez ou outra ainda dá umas escorregadas.

Apesar de todo esse homesickness dele, se você perguntar a ele se ele quer voltar ao país de origem para morar e não passear, a resposta será, obviamente, não, pelo menos não tão cedo. É meio contraditório, pois ele sente tanta falta disto e daquilo, nem eu entendo o caso direito. O fato é, ele gosta de morar aqui, mas percebo que as raízes são extremamente profundas e há coisas que, infelizmente, dificilmente irão mudar. Se tem um aspecto que eu lamento muito por ele, é pela falta que ele sente dos amigos. Incrivelmente, ele sente mais falta dos amigos do que da própria família. Não estou dizendo que ele não sinta falta da família, mas apenas que ele sente mais pelos amigos, pois antes mesmo de vir morar no Brasil, ele já morava longe da família, por causa dos estudos e do trabalho. Ele diz que sente falta de sentar e beber uns drinques com os amigos, falar besteira e coisas que só eles entendem, e eu entendo perfeitamente, especialmente pelo fato de que ele ainda não fez seus próprios amigos aqui.

Enfim, quem tem um estrangeiro em sua vida, uma hora ou outra vai passar por isso tudo, seja você mesmo ou seu parceiro, porque, invariavelmente, alguém estará distante de sua família, amigos e cultura. É bom se acostumar com isso.

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